Uma história de coragem, perseverança e esperança que nos ensina que, mesmo diante do impossível, o amor de mãe é capaz de mover montanhas.
O Menino que Brincava com Ovelhas
Era uma vez um menino de olhos grandes, curiosos e brilhantes chamado Mathyas! Aos cinco anos corria descalço pelos campos de Muitos Capões, no interior do Rio Grande do Sul. Autista, ele tinha seu próprio ritmo de descobrir o mundo.
No sítio onde vivia com os pais, Joseane e Mario, e o irmão mais velho, Lucas, havia veados, graxains e até leões-baios que apareciam ocasionalmente. Mas de todos os animais, havia um especial: Meca, sua ovelha mansinha, companheira de brincadeiras e confidências silenciosas.
Joseane observava o filho brincar ao ar livre com aquela liberdade que só as crianças do interior conhecem. "Ele era bem livre", lembra ela, sorrindo ao recordar os dias em que a rotina era simples: levar e buscar na escola, cuidar da casa e da família.
Era dezembro de 2023, e a vida seguia seu curso natural e tranquilo. Mas o destino tinha outros planos...
Quando a Tempestade se Aproxima
O primeiro sinal veio da escola. Os professores notaram algo que ia contra a natureza alegre de Mathyas: ele só queria dormir e para um menino acostumado a correr e brincar, aquela mudança chamou a atenção.
Joseane, como toda mãe, sentiu o coração apertar. No posto de saúde, ouviu: "Está tudo bem com seu filho." Mas o instinto sussurrava o contrário.
No sábado seguinte, a verdade começou a se revelar. Mathyas recusou a mamadeira e o iogurte, seu alimento preferido que "nunca podia faltar". Foi então que Joseane notou um pequeno caroço no mediastino do filho. Por um momento, a palavra "câncer" atravessou sua mente como um raio, mas ela a afastou imediatamente. Ainda não estava pronta para essa realidade.
A Peregrinação em Busca de Respostas
O que se seguiu foi uma jornada de dois meses que testaria todos os limites da resistência da família!
As noites se tornaram um pesadelo. Mathyas suava intensamente e tossia com tamanha força que chegava a ficar sem fôlego e vomitar. O intervalo entre as tosses diminuía, e com isso, a esperança de Joseane de que fosse apenas algo passageiro.
"Eu já estava sentindo o peso da aflição por não saber o que estava acontecendo e não receber a atenção devida", relembra ela, com a voz embargada pela memória daqueles dias sombrios.
Joseane, seguiu levando Mathyas todos os dias no postinho de sua cidade e sempre voltava sem respostas para casa, apenas com receitas de antialérgico e antibiótico, chegaram a diagnosticá-lo com problema na tireoide... Até que, um dia, um anjo da guarda apareceu: era a Dra. Lairis!
Percebendo a situação desesperadora da família, Dra. Lairis, passou Mathyas na frente de outros pacientes e, após ouvir o relato dos pais e analisar os exames, pronunciou a palavra que mudaria tudo: "tumor".
O Dia em que o Chão Desabou
30 de novembro de 2023. Uma data que ficaria gravada para sempre na memória de Joseane. Após insistir por uma tomografia, ela leu o resultado: linfoma.
"Ali caiu nosso chão, a gente não queria acreditar naquilo, que era verdade", conta Joseane, revivendo aquele momento devastador.
[...] a gente olhando ali o Mathyas dentro do carro [...] nem sabia o que tava acontecendo e a gente desesperado.[...] Nisso uns nossos amigos nossos foram nos buscar para irmos pra casa e nem deu tempo de chegar em casa tivemos que ir direto no posto de saúde que daí ele precisava de oxigênio [...] sei que ele passou tão mal, tão mal que deu uma crise tão forte nele de tosse!
Não houve tempo nem para chegar em casa. Mathyas precisava urgentemente de oxigênio. A crise fez com que seu coração disparasse para 200 batimentos por minuto enquanto a saturação despencava.
A família ainda aguardou por dias no Hospital de Vacaria, período em que Mathyas passou no soro aguardando uma vaga no Hospital Geral de Caxias do Sul.
O Diagnóstico que Mudou Tudo
Já em Caxias, no Hospital Geral, sai o diagnóstico, era um Linfoma Linfoblástico das células T - CID 10 C84. Nome complicado para um tumor que já havia crescido 10,5 centímetros e estava pressionando o coração, paralisando o diafragma e comprimindo a traqueia de Mathyas.
O quadro geral era ruim e Mathyas precisou ficar no isolamento, porque estava em sofrimento respiratório.
Em meio às notícias sobre o estado do seu menino, termos desconhecidos e dúvidas angustiantes, Joseane se viu sozinha, em uma cidade desconhecida, vendo seu filho ser entubado.
"Daí quando vi eles mexendo nele entendi que entubar era pra botar lá dentro o tubo... daí eu fiquei em choque, não tava acreditando no que tava vendo", lembra ela. "Parece que é mentira aquilo."
O Encontro com a Esperança
Foi em meio ao caos que Joseane conheceu Clenes, assistente social, e Renata, psicóloga, ambas da equipe Domus. Era 4 de dezembro de 2023, e ali começava uma nova fase da jornada! Agora, ela não estaria mais sozinha, mas amparada por mãos que se estendiam para confortá-la e apoiá-la.
A Domus se tornaria mais que um local de hospedagem; seria um verdadeiro lar longe de casa, onde Mathyas seria mimado com gostosuras e onde Joseane encontraria o apoio necessário para enfrentar os dias mais difíceis de sua vida.
Dias de Prova
A UTI do Hospital Geral, se tornou o mundo de Mathyas por quarenta longos dias, lá foi realizada uma traqueostomia de urgência, um procedimento muito necessário no caso dele e especialmente arriscado porque passaria acima do tumor.
Para uma criança autista, reaprender a andar, comer e se comunicar representava desafios multiplicados exponencialmente! Com isso, Joseane precisou aprender uma nova linguagem, a dos movimentos labiais. Logo após o procedimento, Mathyas com sede, pedia água com insistência, mas não podia receber.
"Ele me pedia água, tadinho e não podia dar, eu era proibida de dar e é a pior coisa ver isso", relembra, com o coração partido. "Daí eu pensei, quer saber, vou molhar o algodão com água e molhava os lábios dele... me cortava o coração."
Com várias intercorrências, Mathyas foi acompanhado pela Dra. Ana, Dr. Felipe e Dr. Umpierre.
Nesse período, apesar de diminuir um pouco de tamanho, o tumor ainda não estava pequeno suficiente para uma cirurgia. Enquanto os dias passavam, Mathyas desenvolveu trombose e precisou tomar anticoagulantes.
No dia 8 de janeiro de 2024, Mathyas saiu da UTI e foi para o quarto! Agora, ela precisaria aprender entre outras coisas a lidar com a nova realidade, aprender como realizar a aspiração do estoma traqueal, nome dado ao orifício (buraco) que fica na traqueia após o procedimento, permitindo a passagem de ar diretamente para as vias respiratórias, sem passar pelo nariz ou pela boca.
Houve inúmeras intercorrências! Joseane, conta que esse período foi de muita angústia, porque mal se recuperava de um susto, outro acontecia em seguida.
Quase Despedida
Houve momentos em que Joseane quase perdeu seu menino. Em fevereiro, após uma tomografia de rotina, o estoma traqueal de Mathyas obstruiu. Ele não conseguia respirar, a saturação despencava, os batimentos aceleravam.
Mathyas, estava sem condições de respirar sozinho e ficava desfalecendo. Joseane conta:
"Estava sendo retirada da sala, eu via enfermeiros, técnicos e médicos, entrando e saindo do quarto de Mathyas correndo e todo tipo de pensamentos passou pela minha cabeça e meu coração se apertou!"
Foi necessária uma injeção de adrenalina e respiração mecânica. Por pouco ela não perdeu seu filho.
A Decisão Mais Difícil
Em março chegou a hora da decisão mais difícil: a cirurgia. O tumor havia necrosado, e apesar de ter regredido em tamanho, precisava ser removido.
Ler o Termo de Consentimento foi uma das experiências mais angustiantes para Joseane. Em suas palavras:
[...] eu tava chorando desesperada [...] lá tinha risco de infecção, de hemorragia, trombose, morte [...] coisas horríveis [...] daí dias depois foi pra cirurgia [...] acordou chorando sem saber o que tava acontecendo [...] e eu tava muito nervosa, muito nervosa [...]
O dia da cirurgia chegou e apesar de tentarem manter a calma, foram cinco horas de cirurgia, que pareceram uma eternidade para uma família que só sabia esperar e orar.
Quando acabou, foram tranquilizados, tudo havia dado certo, até que o corte começou a abrir e dois dias depois, estava ele de volta à sala de cirurgia para cuidar dos pontos que estavam abrindo.
De volta à unidade de terapia intensiva, algo não estava certo. Mathyas não se recuperava como esperado após a cirurgia. Novos raios-x revelaram uma complicação inesperada: havia líquido acumulado nos pulmões do pequeno guerreiro.
Mais uma vez, seria necessário submetê-lo a procedimentos adicionais. Uma lavagem pulmonar se fazia urgente. Naquele momento, o corpinho frágil de Mathyas carregava dois drenos, um da cirurgia cardíaca e outro para drenar o líquido dos pulmões. Era mais um obstáculo em sua longa jornada de recuperação.
O Apoio que Fez a Diferença
Durante toda essa jornada, a Domus foi muito mais que um local de apoio. Foram 108 atendimentos com assistente social, 47 com psicóloga, 161 cafés da manhã, 58 almoços, 152 jantares, cestas básicas, medicamentos, transportes, mas principalmente, carinho e apoio.
Mathyas, recebeu alta com a condição de ter somente para si, um Aspirador Elétrico de Secreção para Traqueostomia, um aparelho projetado para facilitar a remoção de secreções. Contudo, Joseane não tinhas recursos para comprá-lo!
Sem demora, Clenes solicitou para a Domus a compra e pouco tempo depois, Joseane não precisou mais se preocupar!
Abril chegou e agora, mãe e filho podiam descansar fora do ambiente hospitalar, hospedados na Domus, tiveram acesso à privacidade, além das gostosuras com as quais a equipe Domus mimava Mathyas.
Durante essa jornada de coragem e resiliência, a Domus proporcionou gratuitamente:
- 108 atendimentos com a assistente social
- 47 atendimento a psicóloga
- 161 cafés da manhã
- 3 cestas básicas
- 3 cortes de cabelo
- 24 compras na farmácia
- 4 exames específicos
- 5 aplicações de laserterapia
- 58 almoços
- 152 jantares
- 64 transportes
Joseane, recorda o apoio recebido pela equipe Domus, em todos os meses que seguiram ao tratamento do Mathyas:
"A Clenes levava a gente no hospital e trazia de volta... sempre apoiando pro que precisava... a Renata também... era fralda, remédio, comida... tudo que a gente precisava", lembra Joseane com gratidão.
O Dia da Libertação
14 de agosto de 2024. Uma data para ser celebrada para sempre. Mathyas finalmente tirou a traqueostomia e a sonda. Estava livre. "Foi muito tranquilo lidar com ele livre daquelas sondas", conta Joseane, quase não acreditando que aquele dia havia chegado.
A Lição de uma Mãe Guerreira
Joseane deixa um conselho que ressoa como um eco de sua própria jornada:
"Conhecer seu filho é essencial. Não aceitem o primeiro diagnóstico [...] se os sintomas continuarem, tem que insistir também [...] exigir investigação [...] e sempre ter fé que vai dar tudo certo e entregar nas mãos de Deus."
Um Novo Capítulo
Julho de 2025. Mathyas, agora com 6 anos, vem mensalmente a Caxias do Sul para acompanhamento. O menino que brincava com ovelhas no interior voltou a sorrir, a brincar, a ser criança.
Está no primeiro ano da escola, faz seus trabalhinhos em casa "muito rápido, sem dificuldade nenhuma", como conta orgulhosa sua mãe. O autismo não o impede de ser brilhante, e o câncer não conseguiu roubar sua alegria.
Em meio a toda essa jornada de luta e incertezas, algo especial aconteceu na igreja evangélica que a família frequenta. Mathyas recebeu uma revelação de cura que trouxe paz ao coração de todos!
E como se confirmasse essa promessa divina, recentemente o Dr. Felipe trouxe a notícia que toda a família aguardava: a doença está em remissão. Mathyas e seu tratamento deve terminar em novembro de 2025.
Para Joseane, essa confirmação médica não foi apenas um resultado clínico, mas a materialização de uma fé que nunca vacilou, mesmo nos momentos mais sombrios da jornada.
A história de Mathyas e Joseane nos ensina que o amor de mãe é capaz de mover montanhas, que a persistência pode abrir portas que pareciam fechadas para sempre, e que a esperança, mesmo nos momentos mais sombrios, pode ser a luz que nos guia para casa.
Hoje, quando Mathyas corre novamente pelos campos de Muitos Capões, cada passo é uma vitória. Cada risada é um hino de gratidão. Cada dia é um presente que quase foi perdido, mas que foi recuperado pela força do amor, da ciência e da solidariedade humana.
A Domus continua sua missão de acolher famílias como a de Mathyas, oferecendo não apenas hospedagem, mas esperança, cuidado e amor quando mais precisam. Porque acreditamos que nenhuma família deve enfrentar o câncer sozinha.
Fonte: Joseane Camargo